"A Senhorita X afirma que não tem mais cérebro nem nervos nem peito nem estômago nem tripas, somente lhe restam a pele e os ossos do corpo desorganizado [...]"

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

every you - every me


ele dorme, eu escrevo. eu escrevo, ele lê. ele vai dormir e eu vejo seriados na TV. eu cozinho e ele navega. e comemos, devoramo-nos.

ele acha que tem um quê de maldade. eu me acho um monstro lamacento. ele crê que já causou dores, eu creio que já causei dores.
nos separamos e sinto saudades. ele ocupa boa parte dos meus pensamentos, nunca sei no que ele pensa.
somos do submundo: onde há prostituição, promiscuidade, inversões e diversões nos sentimos em casa.
a casa dele é diferente da minha. tudo parece mais aconchegante, mas a cama fica fria quando ele não está lá.
eu tempero o que ele come, ele tempera meu tédio: deixa tudo mais saboroso.
eu deixo a casa com cheiro de cigarro, ele briga. eu finjo que não ligo.
ele, às vezes, é mais novo que eu. eu, às vezes, sou mais nova que eu.
ele gosta de vulgaridades, eu gosto de ser vulgar para ele. gosto de estar aberta, exposta, à sua disposição.
ele é carinhoso, amoroso, quente, atencioso. ser amado. por mim e tantos outros.
ele gosta do meu cabelo e da minha pela branca manchada de vermelho. eu gosto da sua barba e de quando me algema.
ele jogou pela janela um objeto que demoramos para encontrar, um símbolo de um dia feliz. e eu chorei. mas tudo bem, nosso compromisso foi cauterizado em nossas peles – ferro e fogo.
ele transforma a dor em raiva – pulsões de ódio – eu transformo a dor em choro – pulsão de desespero.
eu preciso dele e creio que ele também precise de mim: agulha, linha, álcool e remédios. §- costurando -§

--[quem sabe um dia a gente se cura.]--

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

óh, meu amor, como os seus medos estavam invertidos.
você não faz ou fez mal à quem quer que seja.
não deveria jamais ter tido medo de me machucar, pois, eu sabia, que o primeiro golpe [e provavelmente todos os outros] seriam desferidos por mim.
cravei uma faca em seu peito e não sei como tirá-la.
queria curá-lo e o feri ainda mais.

mas, agora, agora sei o queve ser feito de mim:
1. corte minhas mãos. elas jamais acariciaram alguém. apenas arranham, machucam, são providas de unhas venenosas: mãos de um midas. depois, queime-as, e te garanto, meu amor, que para onde forem suas cinzas nada nascerá além de ervas venenosas.
2. corte meus pés. eles sempre estarão andando por caminhos irônicos e egoístas. são pés sarcásticos, patas de bode. queime-os também e o destino do local de suas cinzas será o mesmo de minhas mãos.
3. machuque todo o restante do meu corpo, como num suplício medieval. esse corpo é o que carrega a maldade [tenha certeza de que a cabeça seja bem triturada], depois, faça dele o que quiser, mas não o toque. há sangue de sicuta correndo por minhas veias.

e então, só então, não te farei mais sofrer.
é provável que sinta minha falta, mas a hipótese é quase correta: morta te farei menos mal do que viva.
paraíso ou inferno?
achei que havia vislumbrado um dos dois
pura mentira.

é sempre a mesma merda.
expulsa-me mas não tenho coragem de ir;
e durmo na sala, enrolada no vestido psedo-retrô de bolinhas sem saber o que houve, de verdade.

será que você poderia me explicar?

 p.s.: tentei sumir de novo. sem você a vida não faz sentido. mas não tinha os acessórios adequados. não consegui ir embora. explica-me: o que fiz de mim?

não sou nada além de merda, que bóia...
deveria ter percebido issso antes.

I love you.
yo no me imagino sien ti. és parte de mi vida, de mi cuerpo, de mi sangre.

indefesa, humilhada, sangro por ti.
explica-me: o que fiz?

talvez seja como minha mãe sempre disse:
- sua natureza é má e tudo o que provém dela só causa dor e desespero.
é bem provável que ela não esteja errada.

eu sou o caos,  se não suporta issso, afaste-se de mim enquanto é tempo: não quero macular sua santidade, quero morrer.

levem-me, demônios, anjos, sejam lá o que for. porque você é minha razão de viver e sem você, nada mais importa.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

era uma vez...

uma pequena moça, de dez anos, que caminhava pela floresta levando uma cesta em meio a escuridão. o escuro não a assustava, nunca teve medo dele. mas, perguntava-se sobre os objetos que carregava em sua cesta: porque o homem, que havia sido tão gentil com ela, oferecendo-lhe uma brincadeira em sua casa durante a noite, havia pedido aqueles objetos em específico? sua imaginação vagueava pelas centenas de brincadeiras que poderiam fazer com aquelas coisas que havia roubado da despensa de seu pai.

chegou à porta da casa do homem e tocou a campainha. não houve resposta. será que ele havia se esquecido do que tinham combinado e ela voltaria para casa sem nenhuma diversão? será que teria sido inútil fugir no meio da noite e, sorrateiramente, como uma gata, passar pelo pai dormindo na sala, mexer em sua caixa de ferramentas e ir andando, quase saltitando com a mente cheia de idéias até lá?

[foi tomada de assalto por um sentimento que não sabia bem explicar o que era. se o homem não abrisse a porta, sentiria-se... rejeitada? desejava intensamente estar perto daquele homem novamente, e a porta fechada significava o fim... mas o fim de que? sentia-se como se estivesse prestes à ser apresentada a um novo mundo: um mundo mágico, e não queria perder um minuto, nem mesmo um segundo, para estar naquele mundo.]

não, não foi inútil. o homem abriu a porta. do escuro onde estava observou a silhueta do homem na penumbra que tomava, o que ela pensou ser, sua sala: ele era alto, tinha mãos grandes e brilhantes olhos castanhos que se escondiam por de trás das lentes do óculos de aros negros... mas não à assustava, tinha um olhar caloroso e confortador.

foi convidada à entrar, sentou-se e conversou bastante com aquele semi-desconhecido... num momento, olhou para as mãos do homem e sentiu-se pequena, infantil em seu conjunto de saia e blusa vermelhas.

ela não saberia dizer bem como tudo começou, lembrava-se apenas da frase:
- chegou a hora de nós dois brincarmos.

o homem, então, mexeu em sua cesta e tirou de lá um par de algemas e uns pedaços de corda.
- espero que goste da brincadeira, mas, não preciso de esperanças: sei que vai gostar.

antes de qualquer reação sua, as enormes mãos do homem tocavam seu corpo, algemavam-na e amarravam-na no sofá em uma posição que a deixava exposta. sendo ainda criança e sem muitos pudores, não sentiu muita vergonha, estava apenas curiosa para saber como seria a brincadeira.
e, rapidamente, descobriu: antes de qualquer ação, antes de respirar, antes de conseguir fechar e abrir os olhos ou proferir qualquer palavra, o corpo do homem estava sobre o seu, rasgando sua calcinha, tocando-a, penetrando-a. sentia uma dor muito forte e começou a chorar. as mãos do homem foram até a sua boca, tapando-a: - quietinha, minha menininha putinha.

não sabia o que fazer, sentia-se suja e dolorida, mas... num impulso e estremecer sentiu uma corrente elétrica que percorreu todo o seu corpo e foi parar lá onde o homem a penetrava. não sabia o que havia sido aquilo, mas, percebeu que, no mesmo momento, mãos foram postas em volta de seu pescoço privando-a de respirar, e, logo depois, tudo acabou.

o homem já não estava mais sobre ela e ela não sabia o que pensar: o que havia sido feito dela? mas não pensou mais... com as mãos agora livres [podia fugir, se assim desejasse, mas não o fez] tocou-se entre as pernas e sentiu o calor e os líquidos que escorriam; levou as mãos à boca: gosto de sangue, gosto do homem e seu gosto. um gosto que jamais havia sentido. olhou para aquele semi-desconhecido e não se sentiu mais pequena, nem infantil.

então, como quem toma repentinamente uma decisão ao entender o que ocorre, levantou-se e sentou-se no colo do homem, quente, confortável e proferiu uma única palavra:
- ensina-me.


moral da história: [com o perdão dos psicólogos] – crianças também gozam [e gostam!]

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

[- caio fernando abreu]

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

; “sim, eu desejo isso. aquilo que diriam incorreto, ou imoral: quase tudo o que é assim nomeado atrai meus sentidos.”
[chicotes, velas, lâminas – frias ou quentes – palmatórias, algemas]: masoquismo.


sem regras. não há manuais ou livros: apenas corpos excitados, palanques de pura infecção. sexualidade? jamais no singular. sempre plural: sexualidades.

o singular cria barreiras, juntamente com as regras rígidas. oras, como pode a intensidade circular e fluir se há muros de leis não flexíveis, se devemos chamá-la com um detestável final desprovido de “S”?

nós, criaturas, já saímos à luz do dia mostrando nossos corpos marcados [feridos, machucados, doloridos]: atitude anti-lei-sanitária. querem nos tratar e diagnosticar, mas não estamos doentes. os diagnosticadores sim, esses encontram-se enraizados dentro dos piores tipos de doenças: deus, ciência, lei do homem – todas vindas de uma mesma bactéria comum, a necessidade do metafísico, do superior, da VERDADE.

por isso, aos espertos, cabem os passos leves, enganadores: fuga noite a dentro, atitudes bárbaras, sobriedades momentâneas em meio à toda ebriedade que nos conquista e arrasta.

procure um caminho tortuoso [mas não procure luzes no fim], passe por ele, abra uma porta qualquer, relevo ou adjacência e corra: saia de si.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

when, where and why? whatever.


hoje o meu desejo é apenas recostar.
pensar: será fraqueza ou dupla força?
será um anel apertado no dedo ou será a impossibilidade de nós e nossos anéis chocarem mais que dedos livres que nos faz gargalhar?
 será desespero ou aspiração?

não, não é fraqueza, não.
é apenas vontade de união.
união ao nosso jeito: sem subtrair, apenas multiplicando.

1. o que estamos fazendo?
R: so[a]mando.


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

in-verção, in-venção, in-volução



olhou de cima e observou a criatura amada na posição que gostava de ficar e fazer ficar.
as marcas – negras e vermelhas – tornavam tudo mais excitante, mas era preciso calma.
tocou, devagar, com a ponta da língua as áreas em torno daquilo que queria explorar melhor. experimentava devagar. sentia os gostos e os cheiros e excitava-se com aquilo que ainda não havia feito.
molhou a ponta dos dedos e passou, com leveza, o indicador em seu cu. num momento, sua língua já não experimentava levemente. sugava. beijava. queria aquele gosto em sua boca mais que já quis muitos, muitos outros.
então, preparou-se.

– devagar.

obedeceu. sempre obedecia. mas nem sempre se continha.
quando enfiava com mais força ouvia gemidos mais altos, gritos...
enrabava seu dono, seu senhor. o ouviu gozar de quatro, como mulher.

[gostava[m] daquilo]

o sentiu estremecer e ouviu seus gemidos, grunhidos: devir animal – cão e cadela em inversão; devir masoquista: senhor e escrava. violência que devém.
gozo que devém: dois como matilha de cães – involução.


[contaminação do desejo-prazer-gozo de um no outro]

§


“quem não conheceu a violência dessas sequencias animais que, o arrancam da humanidade mesmo que por um instante [...]?”
- deleuze; guattari.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

"[...] a gente se apertou um contra o outro. a gente queria ficar apertado assim porque nos completávamos desse jeito, o corpo de um sendo a metade perdida do corpo do outro."


[caio fernando abreu]