"A Senhorita X afirma que não tem mais cérebro nem nervos nem peito nem estômago nem tripas, somente lhe restam a pele e os ossos do corpo desorganizado [...]"

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

o corvo.




, mas foi despertada com uma porta se abrindo. luz branca que se precipita para dentro do quarto negro. olhos negros que a olham. boca vermelha, molhada, cheia de dentes e palavras.


mãos de homem no seu corpo. asas de grande pássaro negro na pele.

mãos que contêm o barulho, que afogam os gritos.


- você não é mais criança.


corpo trêmulo. quente, suado.

um balé de pernas que insistem em se manterem fechadas.

pernas que são abertas. olhos de corvo fitam a menina com desejo, desejo sujo de corvo amaldiçoado. e os olhos castanhos de menina desejam o corvo.

carne rasgada, dilacerada.

rosto molhado de menina. de suor. de saliva. sem lágrimas.


e num milagre de não-tempo aconteceu: a menina metamorfoseia-se mulher.

a mulher-menina chora sozinha no escuro. os lençóis bagunçados. vermelho no branco. o sentimento viscoso entre as pernas trêmulas de mulher.


a mulher-menina gos[z]tou.

[pequena imundície]


e a mulher adormeceu num sono povoado por enormes corvos negros que rasgam, mastigam e engolem a carne de pequenas meninas em quartos escuros.


- você não é mais criança.

[não mais]


- qual seu animal preferido?

- aqueles que tem asas de corvo, escuras, e que rasgam a noite em seu voo.

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